
Não é raro que um cidadão português interessado em requerer nacionalidade portuguesa de um dos seus familiares diretos se veja surpreendido com a necessidade de transcrever o seu casamento atual e os eventuais casamentos anteriores, assim como as dissoluções dos vínculos matrimoniais que porventura houver ocorrido no curso de sua vida.
O desconhecimento desta obrigação legal é ainda mais frequente entre cidadãos portugueses que obtiveram recentemente a nacionalidade e/ou residem no exterior.
Ora, após a atribuição ou aquisição da nacionalidade portuguesa, o indivíduo passa a usufruir dos direitos e a cumprir as obrigações que derivam deste estatuto.
Entre essas obrigações, destaca-se, para os fins deste artigo informativo, a atualização do registo civil, um dever legal que abrange todos os cidadãos portugueses, inclusive aqueles que residem fora de Portugal.
Por Que Atualizar o Registo Civil?
O registo civil é o meio pelo qual o Estado português reconhece formalmente eventos importantes da vida dos seus cidadãos, como nascimentos, casamentos, divórcios e óbitos.
Para aqueles que vivem no exterior, os atos civis realizados fora de Portugal devem ser transcritos ou averbados na ordem jurídica nacional. Este procedimento é essencial para garantir a conformidade com a legislação portuguesa e assegurar direitos futuros, como heranças, “transmissão” da nacionalidade aos descendentes, entre outros.
O Código do Registo Civil prevê esta obrigação, garantindo que os atos relacionados ao estado civil sejam devidamente registados e reconhecidos em território nacional.
Ainda que possa parecer mera formalidade, a falta de atualização pode gerar complicações significativas, sobretudo para aqueles que desejam garantir a consecução da nacionalidade aos seus descendentes, cônjuges ou companheiros.
Algumas consequências geradas pela falta de atualização de atos da vida civil em Portugal para fins de obtenção da nacionalidade portuguesa são:
1. Atribuição da Nacionalidade Portuguesa para Descendentes
Os filhos e netos dos cidadãos portugueses, como sabido, podem requerer a atribuição da nacionalidade portuguesa. Para que sejam elegíveis é indispensável que a filiação esteja estabelecida nos termos da legislação portuguesa, dentre outros requisitos legais.
O estabelecimento da filiação é um instituto do direito civil português que determina o vínculo jurídico entre pais e filhos. Este vínculo pode ser estabelecido por diferentes meios, como:
(i) o nascimento na constância do casamento;
(ii) o reconhecimento da parentalidade de natureza voluntária
(iii) o reconhecimento da parentalidade decisão judicial.
É através do estabelecimento formal da filiação que se assegura o reconhecimento da paternidade ou maternidade e, consequentemente, os direitos de descendência, bem como a transmissão da nacionalidade portuguesa.
O deferimento do pedido da nacionalidade dos descendentes depende da demonstração do estabelecimento da filiação em toda a linha de descendência entre o cidadão português e o requerente.
Por esta razão, em muitos casos, para que seja possível fazer prova do estabelecimento da filiação será necessário atualizar o registo civil do descendente português.
2. Nacionalidade para Cônjuges ou Companheiros
Os cônjuges ou companheiros dos cidadãos portugueses podem também requerer a aquisição da nacionalidade portuguesa, atendidos os requerimentos legais.
Caso o casamento tenha ocorrido no estrangeiro, o cônjuge não português que pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa por efeito da vontade precisa comprovar que o casamento está devidamente transcrito em Portugal.
Caso o cônjuge português tenha contraído casamentos anteriores, será necessário transcrever esses casamentos, bem como averbar as respetivas dissoluções antes que o cônjuge atual possa solicitar a nacionalidade.
No caso das Uniões de Facto*, embora não constituam um estado civil, para produzirem efeitos em Portugal — em especial para fins de aquisição da nacionalidade para o companheiro(a) —, é necessário:
Atualizar os atos da vida civil sujeito à registo anterior à união de facto, como casamentos e respetivas dissoluções;
Obter uma sentença judicial que reconheça formalmente a união de facto em Portugal.
Importa destacar que a união de facto ou união civil é um instituto reconhecido em Portugal, e não está sujeito a registo civil. No entanto, caso seja necessária para efeitos de aquisição da nacionalidade portuguesa pelos companheiros, é indispensável o reconhecimento judicial da união em Portugal.
Este reconhecimento pode ocorrer de duas formas:
(i) Revisão e confirmação de sentença estrangeira, caso a união de facto tenha sido previamente reconhecida por decisão judicial no país de origem;
(ii) Ação judicial em Portugal, quando ainda não houve reconhecimento formal da união de facto no exterior.
Para mais informações sobre este tema, consulte: Civil Partnership and Portuguese Nationality
Como atualizar o Registo Civil?
Os cidadãos portugueses que residem no exterior podem realizar o registo de determinados atos da vida civil junto às Conservatórias do Registo Civil em Portugal ou nas Embaixadas e Consulados portugueses do seu local de residência.
O Casamento, seja ele civil, religioso ou civil com efeitos religiosos, podem ser transcritos na jurisdição portuguesa através de um procedimento administrativo de transcrição de casamento efetuado junto ao consulado de Portugal no exterior ou diretamente em uma Conservatória do Registo Civil em Portugal.
A dissolução do casamento realizada no exterior só produz efeitos em Portugal após a tramitação de um processo judicial de revisão e confirmação da sentença estrangeira de divórcio perante o Tribunal da Relação. Para mais informações sobre este tema, consulte: Foreign Court Decision Review of divorce and Portuguese Citizenship
Como referido anteriormente, se houver mais de um casamento e/ou divórcios, para que o casamento mais recente seja reconhecido em Portugal, é necessário transcrever os casamentos anteriores e obter a revisão e confirmação da sentença estrangeira dos divórcios anteriores.
Também são passíveis de registo outros atos da vida civil, como nascimentos, óbitos, alterações de nome, adoção, entre outros.
Manter o registo civil atualizado é mais do que uma obrigação legal; é um ato que protege os direitos dos familiares e das gerações futuras. Ele garante que os descendentes possam preservar os laços com Portugal e que cônjuges ou companheiros acedem os benefícios associados à nacionalidade portuguesa. Além disso, assegura o reconhecimento formal de vínculos jurídicos que impactam heranças, patrimónios e outros direitos.
A atualização do registo civil é essencial para todos os cidadãos portugueses, especialmente para aqueles que vivem no exterior. Esse procedimento garante a conformidade com a legislação, protege direitos e facilita processos relacionados à nacionalidade e outros assuntos jurídicos.
Recomendamos que todos os cidadãos portugueses revisem periodicamente a situação do seu registo civil e, caso necessário, procurem assistência jurídica para garantir a regularidade dos seus atos e evitar complicações futuras.
A FiO Legal está à disposição para auxiliar em todos os processos relacionados à atualização do registo civil, oferecendo suporte especializado para assegurar a conformidade com a legislação portuguesa e proteger os seus direitos e os de sua família.
* Outras denominações: União Estável (Brasil); Parceria Registada ou; União Civil.
By Lidiane de Carvalho.